Seleção brasileira derrotada, é hora de os “especialistas” de plantão descerem o pau no time do Brasil. Sim, os mesmos jornalistas que, até as 17 horas do dia 8 de julho, diziam que o Brasil era favorito contra a Alemanha e que, mesmo sem Neymar e Thiago Silva, a Seleção tinha que “ir para cima” de um adversário que já vinha mostrando o melhor futebol da Copa do Mundo.
Vamos começar com o óbvio: a seleção alemã é melhor do que a
brasileira em quase todos os departamentos, e mesmo com o time completo seria
muito difícil o Brasil ganhar aquela semifinal. Sem dúvida, 7 a 1 é um placar
exagerado, e os brasileiros, mesmo com suas limitações, jogaram muito abaixo de
seu potencial. Isso não quer dizer que houve um “apagão” de 15 minutos, como
sugeriu Felipão; se a Alemanha não tivesse se poupado no segundo tempo, teria
passado dos 10 gols.
Dada a magnitude da derrota, a imprensa não pode escolher um
jogador para ser o bode expiatório. Assim, a culpa de todos nossos males passou
a ser de Felipão. Trata-se de uma simplificação grosseira. Mas, de fato, o
técnico errou muito. E não foi só na partida contra a Alemanha.
Scolari saiu dos trilhos ao acreditar que o time estava
pronto após o título da Copa das Confederações (incrivelmente, o mesmo erro
cometido por Parreira, em 2006, e por Dunga, em 2010). Vale dizer que, nesse
aspecto, 99% da imprensa esportiva brasileira também é culpada, ao endeusar
jogadores medianos e “esquecer” completamente as deficiências táticas e de
preparação da equipe. Mas não foi só isso. Felipão montou uma estratégia de
jogo tosca, digna dos piores times do Campeonato Brasileiro: faltas para parar
o jogo no meio-campo, ligação direta com o ataque, jogadores sem nenhuma total mobilidade
ou versatilidade.
Até aqui, não escrevi nada que os jornalistas mais sensatos
ainda não tenham dito. Isso para não falar dos adeptos do oba-oba, que, num
espaço de 30 minutos, de repente “descobriram” que o futebol brasileiro precisa
de uma reformulação geral (constatação que certamente vai ser varrida para
baixo do tapete ano que vem, se o Brasil ganhar a importantíssima Copa
América).
O fato é que o vexame frente à Alemanha queimou um grupo de
jogadores que até o dia anterior era tratado como uma geração extremamente
talentosa (mesmo com o mau futebol apresentado em todas as outras partidas da
Copa). Assim, vale a pena perguntar: com a cabeça fria, em meio aos destroços
do 7 a 1, o que podemos aproveitar para o futuro da Seleção?
Vejamos setor por setor:
GOLEIROS
Aqui a situação é ruim. A culpa pela má campanha na Copa
certamente não foi de Julio César. Mas o goleiro, aos 34 anos, está em fim de
carreira e certamente não jogará outra Copa do Mundo. Mais preocupante é o fato
de seus reservas, Jefferson e Victor, já terem 31 anos. Ou seja, estão longe de
serem dois jovens promissores. Se em 2018 um dos dois for titular, aos 35, é
porque algo deu errado.
DEFESA
Apesar do desempenho inacreditavelmente ruim contra a
Alemanha, na retaguarda dá para “salvar” alguns jogadores para o futuro. Mesmo
com 33 anos em 2018, Thiago Silva provavelmente terá condições de ser titular
na próxima Copa, ao lado de David Luiz – isso se o ex-zagueiro do Chelsea se
recuperar das feridas da humilhação alemã. Marcelo, com a cabeça no lugar e
mais 4 anos de experiência, também tem talento suficiente para permanecer na
Seleção. Entre os outros, só Henrique teria idade para mais um Mundial – mas,
nesse caso, falta qualidade técnica.
MEIO-CAMPO
Grande problema do Brasil na Copa, o meio-campo da Seleção mostrou-se
capaz, no máximo, de destruir jogadas adversárias. Em termos de idade, até
haveria várias opções, mas aqui o problema é técnico. Luiz Gustavo, hoje com
26, foi muito elogiado no Mundial, mas não é mais que um destruidor. Paulinho
mostrou que foi um dos mais supervalorizados pela Copa das Confederações.
Willian só jogou 60 minutos na Copa e, embora não seja um craque, tem condições
de permanecer como coadjuvante na Seleção. Ramires, com 31 anos em 2018, pode
servir para compor elenco.
Por fim, chegamos à grande incógnita: Oscar. O meia, sem
dúvida, foi uma das grandes decepções do Brasil nesta Copa e pode ter se
queimado. Porém, deve-se lembrar que ele tem só 22 anos e sem dúvida é o mais
talentoso do setor. A questão é como ele reagirá ao fracasso e como evoluirá no
Chelsea. Se tudo der certo, ainda pode ser um dos principais nomes da Seleção
no próximo Mundial.
ATAQUE
Primeiro, o óbvio: Neymar é o craque do time. Em 2018, com
26 anos de idade e 5 temporadas de experiência na Europa, terá tudo para fazer
uma boa Copa. Mas ele precisa de ajuda. Nos dias de hoje, ninguém ganha um
Mundial sozinho (nem Pelé ganharia!), e essa é uma das lições que o Brasil
precisa aprender.
Dentre os colegas de Neymar no ataque, Fred e Jô certamente
não usarão mais a camisa da Seleção. Aliás, é incrível que se tenha acreditado
que esses dois atacantes seriam suficientes para ganhar uma Copa (Fred
notoriamente é um jogador “de fases”; Jô, nem isso). Os outros dois nomes são
incógnitas. Hulk se esforçou bastante, mas não parece ter mais potencial do que
para ser reserva. Já Bernard obviamente não estava maduro para jogar uma Copa
em 2014. Daqui a 4 anos, aos 25, a história pode ser diferente. O jogador tem
talento, mas precisar conduzir melhor sua carreira – se seguir como reserva no
Shakhtar Donetsk, certamente não terá mais oportunidades na Seleção.
TREINADOR
Felipão obviamente deixará o comando após a Copa. E, ao que
tudo indica, será substituído por Tite. Por mérito, o ex-técnico do Corinthians
certamente merece o comando da Seleção. Mas alguém realmente acha que ele trará
ideias novas? Que conseguirá imprimir um modo coerente de jogo, com as variações
táticas necessárias para um Mundial? Ou que exigirá mudanças profundas na
maneira como a CBF organiza a preparação da Seleção, não só na Copa, mas também
em amistosos e outros torneios? A resposta, claramente, é não.
Assim, mais uma vez, terminamos a Copa do Mundo com a
necessidade de uma grande renovação no elenco. Vale lembrar que, em 2006, Dunga
assumiu a Seleção com a missão de renovar o time. O técnico esteve a um passo
de perder o cargo até que desistiu da renovação e apostou em jogadores mais
velhos para a Copa de 2010. Depois dessa derrota, Mano Menezes assumiu,
novamente com a incumbência de dar chance a novos talentos. Novamente, perdeu o
cargo sem conseguir fazer a renovação funcionar. Felipão, por sua vez, deu uma
melhorada na Seleção e colocou em campo um time muito diferente do que atuou em
2010. Diferente, mas não jovem: dos 23 convocados, só 7 têm menos de 27 anos
(Marcelo, Bernard, Luis Gustavo, Oscar, Paulinho, Willian e Neymar). Oito nomes
têm 30 ou mais anos, e não estarão na próxima Copa (ou não deveriam estar).
Ou seja, pela terceira vez seguida, temos que reformular
totalmente a Seleção – em vez de poder prosseguir com um trabalho coerente, com
uma base firme de jogadores, como fez a Alemanha. E pode apostar que o próximo
treinador enfrentará grandes dificuldades para renovar e terá que apelar a
alguns dos jogadores “amaldiçoados” pelo 7 a 1.
E aí é que está o problema estrutural do Brasil: ao
contrário do que o “povão” ainda pensa, nós já não produzimos tantos grandes
jogadores. E não é de hoje. Categorias de base sem estrutura, empresários que
mandam nos clubes, nível técnico baixíssimo do Campeonato Brasileiro, jogadores
que saem do País antes dos 18 anos e falta total de planejamento de longo prazo
são só alguns dos fatores que explicam nossa minguada produção de jogadores
“top” nos últimos 10 anos. Não por acaso, nos últimos 5 Mundiais sub-17 e nos
últimos 5 Mundiais sub-21, só fomos campeões uma vez (nos 10 anos anteriores, o
Brasil somou 4 títulos).
Corrupção, desorganização e falhas da comissão técnica
acompanham o futebol brasileiro desde sua criação. Mas falta recorrente de bons
jogadores é uma novidade. Se imprensa, dirigentes e torcedores não acordarem
para a necessidade de mudanças e continuarem achando que craques “brotam”
sozinhos, a época em que ganhávamos títulos mundiais logo se tornará uma
memória distante.
Para ir mais fundo no assunto, recomendo algumas das
análises mais interessantes que encontrei sobre a derrota brasileira:
Como este é um blog de estatísticas, aí vai uma curiosidade
antes de encerrar o texto: se perder a disputa do terceiro lugar, o Brasil
fechará a Copa do Mundo com um saldo de gols negativo. Tal “feito” só foi
alcançado pela Seleção em duas oportunidades, em 1934 e 1966. Quem diria que em
casa repetiríamos tal desempenho?
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