quinta-feira, 10 de julho de 2014

Copa de 2018: a Seleção terá que se reformular – de novo


Seleção brasileira derrotada, é hora de os “especialistas” de plantão descerem o pau no time do Brasil. Sim, os mesmos jornalistas que, até as 17 horas do dia 8 de julho, diziam que o Brasil era favorito contra a Alemanha e que, mesmo sem Neymar e Thiago Silva, a Seleção tinha que “ir para cima” de um adversário que já vinha mostrando o melhor futebol da Copa do Mundo.

Vamos começar com o óbvio: a seleção alemã é melhor do que a brasileira em quase todos os departamentos, e mesmo com o time completo seria muito difícil o Brasil ganhar aquela semifinal. Sem dúvida, 7 a 1 é um placar exagerado, e os brasileiros, mesmo com suas limitações, jogaram muito abaixo de seu potencial. Isso não quer dizer que houve um “apagão” de 15 minutos, como sugeriu Felipão; se a Alemanha não tivesse se poupado no segundo tempo, teria passado dos 10 gols.

Dada a magnitude da derrota, a imprensa não pode escolher um jogador para ser o bode expiatório. Assim, a culpa de todos nossos males passou a ser de Felipão. Trata-se de uma simplificação grosseira. Mas, de fato, o técnico errou muito. E não foi só na partida contra a Alemanha.

Scolari saiu dos trilhos ao acreditar que o time estava pronto após o título da Copa das Confederações (incrivelmente, o mesmo erro cometido por Parreira, em 2006, e por Dunga, em 2010). Vale dizer que, nesse aspecto, 99% da imprensa esportiva brasileira também é culpada, ao endeusar jogadores medianos e “esquecer” completamente as deficiências táticas e de preparação da equipe. Mas não foi só isso. Felipão montou uma estratégia de jogo tosca, digna dos piores times do Campeonato Brasileiro: faltas para parar o jogo no meio-campo, ligação direta com o ataque, jogadores sem nenhuma total mobilidade ou versatilidade.

Até aqui, não escrevi nada que os jornalistas mais sensatos ainda não tenham dito. Isso para não falar dos adeptos do oba-oba, que, num espaço de 30 minutos, de repente “descobriram” que o futebol brasileiro precisa de uma reformulação geral (constatação que certamente vai ser varrida para baixo do tapete ano que vem, se o Brasil ganhar a importantíssima Copa América).

O fato é que o vexame frente à Alemanha queimou um grupo de jogadores que até o dia anterior era tratado como uma geração extremamente talentosa (mesmo com o mau futebol apresentado em todas as outras partidas da Copa). Assim, vale a pena perguntar: com a cabeça fria, em meio aos destroços do 7 a 1, o que podemos aproveitar para o futuro da Seleção?

Vejamos setor por setor:

GOLEIROS
Aqui a situação é ruim. A culpa pela má campanha na Copa certamente não foi de Julio César. Mas o goleiro, aos 34 anos, está em fim de carreira e certamente não jogará outra Copa do Mundo. Mais preocupante é o fato de seus reservas, Jefferson e Victor, já terem 31 anos. Ou seja, estão longe de serem dois jovens promissores. Se em 2018 um dos dois for titular, aos 35, é porque algo deu errado.

DEFESA
Apesar do desempenho inacreditavelmente ruim contra a Alemanha, na retaguarda dá para “salvar” alguns jogadores para o futuro. Mesmo com 33 anos em 2018, Thiago Silva provavelmente terá condições de ser titular na próxima Copa, ao lado de David Luiz – isso se o ex-zagueiro do Chelsea se recuperar das feridas da humilhação alemã. Marcelo, com a cabeça no lugar e mais 4 anos de experiência, também tem talento suficiente para permanecer na Seleção. Entre os outros, só Henrique teria idade para mais um Mundial – mas, nesse caso, falta qualidade técnica.

MEIO-CAMPO
Grande problema do Brasil na Copa, o meio-campo da Seleção mostrou-se capaz, no máximo, de destruir jogadas adversárias. Em termos de idade, até haveria várias opções, mas aqui o problema é técnico. Luiz Gustavo, hoje com 26, foi muito elogiado no Mundial, mas não é mais que um destruidor. Paulinho mostrou que foi um dos mais supervalorizados pela Copa das Confederações. Willian só jogou 60 minutos na Copa e, embora não seja um craque, tem condições de permanecer como coadjuvante na Seleção. Ramires, com 31 anos em 2018, pode servir para compor elenco.

Por fim, chegamos à grande incógnita: Oscar. O meia, sem dúvida, foi uma das grandes decepções do Brasil nesta Copa e pode ter se queimado. Porém, deve-se lembrar que ele tem só 22 anos e sem dúvida é o mais talentoso do setor. A questão é como ele reagirá ao fracasso e como evoluirá no Chelsea. Se tudo der certo, ainda pode ser um dos principais nomes da Seleção no próximo Mundial.

ATAQUE
Primeiro, o óbvio: Neymar é o craque do time. Em 2018, com 26 anos de idade e 5 temporadas de experiência na Europa, terá tudo para fazer uma boa Copa. Mas ele precisa de ajuda. Nos dias de hoje, ninguém ganha um Mundial sozinho (nem Pelé ganharia!), e essa é uma das lições que o Brasil precisa aprender.

Dentre os colegas de Neymar no ataque, Fred e Jô certamente não usarão mais a camisa da Seleção. Aliás, é incrível que se tenha acreditado que esses dois atacantes seriam suficientes para ganhar uma Copa (Fred notoriamente é um jogador “de fases”; Jô, nem isso). Os outros dois nomes são incógnitas. Hulk se esforçou bastante, mas não parece ter mais potencial do que para ser reserva. Já Bernard obviamente não estava maduro para jogar uma Copa em 2014. Daqui a 4 anos, aos 25, a história pode ser diferente. O jogador tem talento, mas precisar conduzir melhor sua carreira – se seguir como reserva no Shakhtar Donetsk, certamente não terá mais oportunidades na Seleção.

TREINADOR
Felipão obviamente deixará o comando após a Copa. E, ao que tudo indica, será substituído por Tite. Por mérito, o ex-técnico do Corinthians certamente merece o comando da Seleção. Mas alguém realmente acha que ele trará ideias novas? Que conseguirá imprimir um modo coerente de jogo, com as variações táticas necessárias para um Mundial? Ou que exigirá mudanças profundas na maneira como a CBF organiza a preparação da Seleção, não só na Copa, mas também em amistosos e outros torneios? A resposta, claramente, é não.

Assim, mais uma vez, terminamos a Copa do Mundo com a necessidade de uma grande renovação no elenco. Vale lembrar que, em 2006, Dunga assumiu a Seleção com a missão de renovar o time. O técnico esteve a um passo de perder o cargo até que desistiu da renovação e apostou em jogadores mais velhos para a Copa de 2010. Depois dessa derrota, Mano Menezes assumiu, novamente com a incumbência de dar chance a novos talentos. Novamente, perdeu o cargo sem conseguir fazer a renovação funcionar. Felipão, por sua vez, deu uma melhorada na Seleção e colocou em campo um time muito diferente do que atuou em 2010. Diferente, mas não jovem: dos 23 convocados, só 7 têm menos de 27 anos (Marcelo, Bernard, Luis Gustavo, Oscar, Paulinho, Willian e Neymar). Oito nomes têm 30 ou mais anos, e não estarão na próxima Copa (ou não deveriam estar).

Ou seja, pela terceira vez seguida, temos que reformular totalmente a Seleção – em vez de poder prosseguir com um trabalho coerente, com uma base firme de jogadores, como fez a Alemanha. E pode apostar que o próximo treinador enfrentará grandes dificuldades para renovar e terá que apelar a alguns dos jogadores “amaldiçoados” pelo 7 a 1.

E aí é que está o problema estrutural do Brasil: ao contrário do que o “povão” ainda pensa, nós já não produzimos tantos grandes jogadores. E não é de hoje. Categorias de base sem estrutura, empresários que mandam nos clubes, nível técnico baixíssimo do Campeonato Brasileiro, jogadores que saem do País antes dos 18 anos e falta total de planejamento de longo prazo são só alguns dos fatores que explicam nossa minguada produção de jogadores “top” nos últimos 10 anos. Não por acaso, nos últimos 5 Mundiais sub-17 e nos últimos 5 Mundiais sub-21, só fomos campeões uma vez (nos 10 anos anteriores, o Brasil somou 4 títulos).

Corrupção, desorganização e falhas da comissão técnica acompanham o futebol brasileiro desde sua criação. Mas falta recorrente de bons jogadores é uma novidade. Se imprensa, dirigentes e torcedores não acordarem para a necessidade de mudanças e continuarem achando que craques “brotam” sozinhos, a época em que ganhávamos títulos mundiais logo se tornará uma memória distante.

Para ir mais fundo no assunto, recomendo algumas das análises mais interessantes que encontrei sobre a derrota brasileira:





Como este é um blog de estatísticas, aí vai uma curiosidade antes de encerrar o texto: se perder a disputa do terceiro lugar, o Brasil fechará a Copa do Mundo com um saldo de gols negativo. Tal “feito” só foi alcançado pela Seleção em duas oportunidades, em 1934 e 1966. Quem diria que em casa repetiríamos tal desempenho?

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