Todo ano ouvimos na imprensa repetitivos elogios à emoção e ao equilíbrio do Campeonato Brasileiro, que por isso seria um dos melhores torneios do mundo, já que não é previsível como os “chatos” campeonatos europeus.
Nem precisa de muito senso crítico para perceber que não existe nenhuma correlação entre a qualidade técnica e o equilíbrio de uma competição (afinal, o campeonato pode ser equilibrado porque todos os times são bons ou porque todos são ruins). Mas em um aspecto o clichê da imprensa está certo: o Brasileirão é mesmo o campeonato mais equilibrado do mundo!
Essa conclusão vem do Ranking de Equilíbrio dos Campeonatos de Futebol, que eu criei com base no Índice de Gini. Esse índice é usado em economia para medir a desigualdade na distribuição de renda de um país. A lógica do ranking é análoga: em vez da renda, avaliou-se a desigualdade na distribuição de pontos na tabela final dos campeonatos.
É importante notar que, quando se fala de equilíbrio de um campeonato, muita gente pensa só na emoção da disputa pelo título. Só que essa é uma visão parcial: no Espanhol deste ano, por exemplo, a briga pelo título está equilibradíssima, mas existe um abismo separando os dois primeiros colocados do resto. O ranking baseado no Índice de Gini vai além da disputa pelo título e realmente considera o equilíbrio de todas as equipes participantes, do primeiro ao último colocado.
Na tabela a seguir, o nível de equilíbrio foi expresso em porcentagens. Assim, um torneio 100% equilibrado seria um no qual todos os times terminassem o campeonato com a mesma pontuação. E o que seria um torneio com 0% de equilíbrio? Seria aquele em que sempre dá a lógica, ou seja, o melhor time vence todos os jogos. Assim, teríamos uma tabela final em que o lanterna ficou com 0 pontos, o penúltimo teve 6 (supondo um torneio com dois turnos), o antepenúltimo ganhou 12 e assim por diante, até chegar no líder, que teve 100% de aproveitamento. Essa conclusão nem sempre é intuitiva, mas é realmente impossível um campeonato mais desequilibrado do que isso.
Não vou me alongar mais na explicação da metodologia do ranking, que é meio complicada. Se você quiser entender direitinho como os cálculos foram feitos, é só clicar aqui. No ranking abaixo, são considerados os resultados finais da temporada 2009/10 (ou 2010, para os países que seguem o calendário solar). Escolhi só os campeonatos mais relevantes e também descartei os que não usam fórmulas de pontos corridos. Dessa forma, o ranking ficou assim:
País | Equilíbrio |
Brasil (Série B) | 74,35% |
Brasil (Série A) | 63,24% |
Turquia | 58,36% |
Itália | 56,15% |
Rússia | 55,24% |
Japão | 54,25% |
França | 54,24% |
Alemanha | 54,07% |
Argentina | 52,67% |
Escócia | 50,39% |
Grécia | 49,61% |
Espanha | 49,24% |
Bélgica | 47,54% |
Inglaterra | 45,13% |
Coreia do Sul | 43,75% |
Portugal | 40,02% |
Ucrânia | 36,73% |
Holanda | 31,12% |
É impressionante que, em 18 campeonatos pesquisados, o único torneio mais equilibrado que o Brasileirão é o “Brasileirinho”, ou seja, a Série B do nosso campeonato. Não só os torneios do Brasil são os mais equilibrados, como também existe uma diferença considerável em relação aos campeonatos que vêm depois.
O ranking também comprova algumas percepções comuns. Na base da tabela, estão três campeonatos que são tradicionalmente conhecidos pelo desequilíbrio entre grandes e pequenos (embora na Holanda, curiosamente, um dos “pequenos” é que foi campeão). Também é interessante perceber que a Inglaterra, que costumava ser um torneio bastante equilibrado (até os anos 1990, o índice raramente caía abaixo de 60%), agora está se aproximando dos mais desequilibrados do mundo.
Vale notar que esses resultados são relativamente estáveis ao longo dos anos. Pegando as tabelas da temporada anterior, descobre-se que os três torneios mais equilibrados foram, na ordem, o Brasileirão (Série A), o Japonês e o Brasileirinho (Série B). No pé da tabela, os piores foram o Ucraniano, o Grego e o Português – ou seja, não houve diferenças radicais em relação a este ano.