quinta-feira, 9 de maio de 2013

O fim de uma era


1986. A Argentina sagrava-se bicampeã mundial. Diego Maradona consolidava-se como o maior jogador de futebol do mundo. Na Inglaterra, o Liverpool reinava soberano. Enquanto isso, o Manchester United apostava em um promissor técnico escocês para tirá-lo de uma “fila” que já durava 19 anos. Assim, chegava aos Red Devils Alex Ferguson. Nesta semana, após 27 temporadas no comando da equipe, o técnico anunciou sua aposentadoria.

Quem vê a atual força e riqueza do United tem dificuldades para imaginar como a situação do clube era diferente na época da chegada de Ferguson. No ranking histórico do Campeonato Inglês, o Manchester estava atrás de Liverpool, Everton, Arsenal e até do Aston Villa. Em sua história, o clube tinha 7 títulos ingleses e 1 Liga dos Campeões – menos da metade do grande rival Liverpool.

Foi por isso que a diretoria resolveu apostar em um técnico que estava longe de ser um “figurão”. Afinal, ele treinava o Aberdeen, time que só pode ser considerado o 5º maior da Escócia graças, justamente, ao tempo que Ferguson passou lá. Em 8 anos com o técnico, os Dons ganharam 3 de seus 4 títulos nacionais, além de 4 Copas da Escócia, 1 Copa da Liga e, o mais impressionante, uma Recopa europeia, derrotando no caminho Bayern de Munique e Real Madrid.

No United, o começo não foi fácil: Ferguson só ganhou seu primeiro título após 4 temporadas, em 1990, uma Copa da Inglaterra que provavelmente salvou seu cargo, após dois anos seguidos na metade de baixo da tabela do Inglês. O técnico só desandou a ganhar troféus a partir da criação da Premier League, em 1992/3. Desde então, foram 13 títulos nacionais, em 21 disputados.

Somando as copas locais e as conquistas internacionais, Ferguson ganhou 35 títulos com o Manchester United – sem o técnico, os Red Devils têm 25. Na Inglaterra, só Arsenal e Liverpool têm mais conquistas que o treinador escocês.

É inegável que a riqueza trazida pela Premier League foi fator determinante para a hegemonia do United. Por muito tempo, o clube teve o maior faturamento do mundo e, por larga margem, a maior folha salarial da Inglaterra. Por outro lado, times (quase) tão ricos quanto os Red Devils não tiveram o mesmo sucesso – o maior exemplo é o Liverpool, que hoje amarga “fila” parecida com a do United nos anos 1980.

Mais recentemente, Ferguson teve que enfrentar o desafio dos bilionários que compraram Chelsea e Manchester City e ofereceram dinheiro ilimitado para contratações. Em alguns momentos, até que deu certo – os Blues ganharam 3 títulos ingleses, e o City, 1. Mas, mesmo assim, ninguém conseguiu ser campeão mais vezes que o United de Ferguson.

Pode-se dizer que a hegemonia dos Red Devils foi construída por meio de uma parceria perfeita: de um lado, uma diretoria competentíssima, que soube explorar ao máximo as possibilidades de faturamento trazidas pelo novo cenário do futebol mundial; do outro, um técnico que soube se adaptar como ninguém à situação e proporcionou um fluxo quase ininterrupto de sucesso, o qual, por sua vez, contribuiu para que o clube ficasse ainda mais rico.

Essa capacidade de se adaptar é a característica que torna Ferguson único na história. Outros técnicos, como Guy Roux (36 anos no Auxerre) ou Fred Everiss (46 anos no West Brom) até ficaram mais tempo em seus cargos. Mas nenhum teve uma estadia tão longa em um clube tão importante, ganhando tantos títulos. E mais: durante uma época em que a própria essência do futebol estava mudando.

Ferguson soube entender o que era o “novo futebol”: alto faturamento, esporte tratado como espetáculo, empresários poderosos, jogadores “superestrelas”, salários milionários, invasão de estrangeiros... Tudo isso era incipiente quando o treinador assumiu o United. Não só ele se adaptou ao novo contexto, como conseguiu encontrar a receita do sucesso sustentável, montando pelo menos 5 gerações de times vencedores, com pequeno espaço de transição entre eles – outro feito único.

Seria Alex Ferguson o maior técnico de todos os tempos? Evidentemente, não existe resposta objetiva para essa pergunta.

Por um lado, nenhum de seus times marcou época – como, por exemplo, o atual Barcelona, ou o Ajax de Rinus Michels –, nem trouxe mudanças táticas ou de estilo importantes – como, por exemplo, o Arsenal de Herbert Chapman.

Por outro lado, Ferguson conseguiu o raríssimo feito de assumir um clube que já era grande e tradicional e levá-lo a um patamar ainda mais alto, de total supremacia nacional. Enfrentou grandes nomes e saiu-se vencedor na maioria das vezes. Com isso, conseguiu montar uma galeria de troféus simplesmente imbatível:

2 Ligas dos Campeões (Manchester United)
2 Mundiais de Clubes (Manchester United)
2 Recopas Europeias (Aberdeen e Manchester United)
2 Supercopas Europeias (Aberdeen e Manchester United)
13 Campeonatos Ingleses (Manchester United)
3 Campeonatos Escoceses (Aberdeen)
5 Copas da Inglaterra (Manchester United)
4 Copas da Escócia (Aberdeen)
4 Copas da Liga Inglesa (Manchester United)
1 Copa da Liga Escocesa (Aberdeen)
10 Supercopas da Inglaterra (Manchester United)

Como se vê, com a aposentadoria de Alex Ferguson, encerra-se uma era, não só no Manchester United, mas também no futebol mundial.

2 comentários:

  1. Perfeito! Sem mais a acrescentar no texto! Só, como de praxe, uma sugestão: sendo o foco do blog os dados estatísticos, vale uma listinha de todos os treinadores que passaram por alguns clubes enquanto o Sir Alex Ferguson esteve no Manchester United. (ok, pedir pra considerar times brasileiros na lista é até um crime, mas vá lá...)

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  2. Heheheh, você previu o que seria o tema do meu texto seguinte...

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