Na última quarta-feira,
a Fifa divulgou a edição de outubro de seu ranking de seleções. O principal
destaque foi a baixa posição do Brasil, 14ª, a pior da história. Mas será que os
resultados dessa lista, que recebem grande atenção no mundo todo, refletem bem
a realidade?
Logo de cara, dá
para dizer que ela é muito melhor que o Ranking de Clubes da IFFHS, o qual analiseiem um texto de 2011.
Enquanto a lista de times, que inexplicavelmente ganha muita atenção na mídia
brasileira, traz absurdos incríveis, o ranking da Fifa, na maioria dos casos, tem
resultados úteis e coerentes – apesar de algumas falhas.
Isso já é um
grande avanço. Quando o ranking foi criado, em 1993, ele foi mal recebido pela imprensa.
De fato, seu método de cálculo era muito confuso, e apresentava vários resultados
esquisitos. Com o tempo, o público foi “se acostumando” com a lista, que passou
a ser tratada com seriedade. A Fifa também ajudou, ao adotar um sistema mais
simples e realista, tornando seus resultados mais fáceis de aceitar.
Como funciona o ranking
Ao contrário do
que a maioria das pessoas imagina, o método de cálculo do ranking da Fifa é
relativamente simples. Em cada partida disputada, as seleções recebem pontos de
acordo com o produto de 4 fatores, que são:
- Resultado da
partida (3 por vitória, 1 por empate, 0 por derrota, 2 por vitória nos
pênaltis)
- Importância da
partida (de 1, para amistosos, até 4, para a Copa do Mundo)
- Força do
adversário (de 50, para times abaixo da 150º posição no ranking, até 200, para
o 1º colocado)
- Confederação das
seleções (de 0,85, para a Oceania, até 1, para Europa e América do Sul)
Pois bem, soma-se
a pontuação obtida em todas as partidas e divide-se pelo número total de jogos
que a seleção fez nos últimos 12 meses.
Repete-se o procedimento para os 3 anos anteriores. Por último, soma-se
os resultados dos 4 anos, com um peso maior para os mais recentes. Só isso. Não
há mais nenhuma complicação.
Para melhor
entendimento, tomemos o Brasil como exemplo. Os atuais 1001 pontos da Seleção
foram obtidos da seguinte maneira:
- Em 2009:
1045,51 * 20% = 209,10
- Em 2010: 663,42
* 30% = 199,03
- Em 2011: 390,04
* 50% = 195,02
- Em 2012: 397,80
* 100% = 397,80
Total: 209 + 199
+ 195 + 398 = 1001
Qualidades e defeitos do ranking
Em linhas gerais,
a mecânica do ranking é muito boa. Os 3 principais fatores considerados
(resultado, importância e adversário) são realmente os mais importantes, e a
ideia de calcular o produto (e não a soma) dos 3 é uma maneira elegante de ponderá-los
(note-se que, pela regra, uma derrota sempre vale 0 pontos, independente de
qualquer outro fator). Incluir a força do adversário na conta é importantíssimo
e também serve para diferenciar, de maneira objetiva, torneios de continentes
diferentes (a Euro vale tanto quando a Copa da Oceania, mas nesta última a
pontuação acaba sendo menor, pelo baixo ranking dos adversários).
Ao fazer a média
dos pontos obtidos em todos os jogos, o ranking também procura equilibrar as seleções
que jogam muito com aquelas que atuam menos vezes. Aliás, isso faz com que até
uma vitória possa diminuir a pontuação, se o país, por exemplo, jogar muitos
amistosos contra “nanicos”. Por outro lado, é possível um time ganhar pontos
mesmo sem jogar (basta que em um mês seja descartada uma derrota). Por fim, a
ideia de dar mais peso aos jogos do último ano faz com que o ranking reflita
melhor o “momento” vivido pelas seleções.
No entanto, há
distorções importantes no método. Primeiro, no que diz respeito à importância
das partidas. Um jogo de Copa do Mundo vale só 4 vezes mais que um amistoso,
diferença muito pequena. Pior é o peso 3 atribuído à Copa das Confederações: isso
faz com que o torneio, que a maioria dos países não leva muito a sério, seja
tão importante quanto a Eurocopa e a Copa América!
Os pontos
distribuídos pela força dos adversários também têm sérios problemas. A Fifa faz
a distribuição de acordo com o ranking, o que é certo, considerando 200 pontos
para o 1º colocado e subtraindo 1 ponto a cada posição, mantendo um mínimo de
50 pontos. Ou seja, vencer a Espanha só vale 4 vezes mais do que ganhar do
Butão. Pior: derrotar San Marino (3*50 pts) vale mais que empatar com a Polônia
(1*147 pts). Isso não faz sentido.
O terceiro
problema é o último fator do ranking, relativo à confederação das equipes. Esse
é um item totalmente arbitrário. Afinal, se já é considerada a força das
seleções, por que contar também seu continente? Assim, uma vitória sobre a
Eslovênia (35º colocada) vale 3*165*1=495 pontos, enquanto ganhar da Costa do
Marfim (16ª) vale menos, só 3*184*0,86=475 pontos, embora os africanos estejam
muito à frente dos europeus no ranking. Pior: um europeu que derrote o Brasil,
hoje, ganha (186*3*1) 558 pontos; já um asiático que consiga a mesma proeza
leva só (186*3*0,93) 519 pontos. Por quê?
Para piorar, a
determinação desses fatores parece arbitrária. Embora a Fifa explique que os
números são baseados no desempenho nas últimas 3 Copas, não está claro a conta
que foi feita para chegar a 0,85 para Oceania, 0,86 para África e Ásia e 0,88
para a Concacaf. Enfim, é um recurso que, além de “deselegante”, torna o
ranking mais injusto.
Outro defeito do
ranking da Fifa é que ele não leva em conta alguns fatores importantes. O
principal deles é que não distribui nenhum “bônus” por desempenho nos torneios.
Ou seja, se um país é campeão da Copa do Mundo, só ganha pontos pelas partidas
que venceu e empatou. O título, em si, não vale nada. Com isso, é perfeitamente
possível que o 3º colocado acabe com uma pontuação melhor que a do campeão,
desde que tenha feito uma boa fase de grupos e tenha enfrentado adversários
fortes.
Outra omissão
importante é que não interessa para o ranking quem jogou em casa nas partidas.
Assim, derrotar a Bolívia em La Paz ou em Fortaleza rende exatamente a mesma
pontuação.
O sistema também
permite que diferenças nos calendários dos continentes causem distorções. A
África, por exemplo, se beneficia ao ter seu torneio continental disputado a
cada 2 anos. A América do Sul perde, porque a Copa América não tem
eliminatórias. Zonas com qualificatórios longos para o Mundial são beneficiadas
sobre aquelas com torneios mais enxutos.
Além disso, há o
prejuízo aos países-sede de torneios importantes, que deixam de ganhar pontos
por não disputar eliminatórias – essa é uma das explicações para a má posição
atual do Brasil. A Seleção, hoje, disputa só amistosos, os quais valem menos
pontos (também não ajuda nada o fato de só conseguir ganhar de adversários
fracos). Por isso, é de se esperar que o Brasil continue a cair no ranking,
atingindo o “fundo do poço” às vésperas da Copa das Confederações, em 2013.
A decisão de
fazer com que as partidas mais recentes tenham mais valor – que à primeira
vista parece uma boa ideia – também causa sérias distorções. O motivo é que os
torneios continentais, que têm peso importante no ranking, não acontecem todos
no mesmo ano. Assim, os times europeus contam hoje com 100% dos pontos obtidos
na Euro-2012, enquanto os sul-americanos têm que se contentar com 50% dos
pontos da Copa América de 2011. Não é por acaso que atualmente o ranking da
Fifa apresenta 10 europeus entre os 13 melhores colocados.
Resultados atuais
Todas essas
falhas são suficientes para tirar a validade do ranking? A resposta é não. Com
as devidas ressalvas, o ranking da Fifa dá uma idéia razoável do equilíbrio de
forças no futebol mundial.
Tomando como base
a lista mais recente (de outubro de 2012), dá para dizer que os principais
resultados estão corretos: a líder é a Espanha, como não poderia deixar de ser,
a maioria dos primeiros colocados são times “grandes”, e é preciso sair do “top
30” para achar seleções de menor expressão.
No entanto, apesar
dos méritos, há alguns resultados difíceis de engolir. Por exemplo, Portugal em
3º lugar é estranho, mas pode ser justificado pela boa campanha na Eurocopa.
Mas e a Inglaterra em 5º? O time caiu nas quartas da Euro e nas oitavas do
Mundial, se dá bem graças só ao desempenho nas eliminatórias. Aliás, só pode
ser esse o motivo para a Colômbia aparecer em 9º, mesmo sem passar das quartas
na Copa América (perdeu para o Peru!) nem disputar o Mundial. Grécia em 10º – à
frente do Brasil – e Argélia (nem disputou a CAN) como 2º melhor africano
também são resultados esquisitos.
Resumindo, o
ranking da Fifa tem um conceito interessante e apresenta resultados bons, considerados
como um todo (muito melhores, por exemplo, que o fraquíssimo ranking de clubes daIFFHS).
No entanto, algumas falhas pontuais nos critérios permitem distorções, que se
evidenciam em alguns resultados estranhos que destoam do conjunto. Embora a
lista da Fifa não seja ruim, seria possível montar um ranking de seleções
melhor.
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