sábado, 11 de fevereiro de 2012

O que é mais importante: ataque ou defesa?

Ao montar um time, os treinadores inevitavelmente se defrontam com uma dúvida: vale mais a pena privilegiar o ataque (ou melhor, jogadores com funções mais ofensivas) ou a defesa (jogadores com funções mais defensivas). O ideal, obviamente, é ter as duas coisas, mas existem numerosas situações em que é preciso escolher, por exemplo, entre um volante “destruidor” ou um meia criativo que não marca. E então, o que é melhor?

Metodologia

É possível usar dados estatísticos para responder essa polêmica questão. Resumidamente, a metodologia é a seguinte: em um campeonato, classificam-se os melhores ataques (de acordo com o número de gols marcados), do primeiro ao último lugar, e faz-se o mesmo com as defesas (pelos gols sofridos).

Compara-se, então, cada uma dessas listas com a classificação do campeonato, gerando-se dois gráficos (um para o ataque e outro para a defesa) como o do exemplo abaixo:


Nesse gráfico, é possível calcular a regressão linear e, mais importante, o coeficiente de determinação (r²) entre as variáveis (ataque x classificação final e defesa x classificação final). Quanto mais alto o coeficiente, mais importante foi essa variável para o resultado final do campeonato. Comparando-se as duas, pode-se dizer se, em um torneio, o ataque ou a defesa foi mais importante.

Para fazer este texto, calculei os coeficientes de correlação nas últimas 10 temporadas dos Campeonatos Inglês, Italiano, Espanhol e Brasileiro (9 temporadas, neste caso, já que a edição de 2002 não foi disputada por pontos corridos).

Resultados

Os resultados do levantamento foram surpreendentes. Excluindo-se altos e baixos esporádicos, esperava-se equilíbrio entre ataque e defesa. No entanto, não foi o que se verificou.

Na média dos 39 torneios pesquisados, o ataque levou vantagem: 22 vezes ele foi mais importante, contra 16 da defesa (houve 1 empate). Mas os dados ficam ainda mais interessantes quando analisamos os quatro países separadamente. Veja só:

Campeonato Brasileiro
Temporada
Ataque
Defesa
Mais Importante
2011
53,8%
59,5%
Defesa
2010
56,3%
69,4%
Defesa
2009
58,3%
67,9%
Defesa
2008
52,3%
80,5%
Defesa
2007
29,3%
59,9%
Defesa
2006
51,0%
79,5%
Defesa
2005
58,1%
19,4%
Ataque
2004
22,5%
25,0%
Defesa
2003
31,2%
55,2%
Defesa

Campeonato Inglês
Temporada
Ataque
Defesa
Mais Importante
2010/1
60,2%
75,2%
Defesa
2009/10
68,4%
84,4%
Defesa
2008/9
70,1%
89,1%
Defesa
2007/8
70,6%
86,6%
Defesa
2006/7
92,3%
71,1%
Ataque
2005/6
84,4%
78,7%
Ataque
2004/5
63,0%
77,9%
Defesa
2003/4
55,1%
86,9%
Defesa
2002/3
77,9%
63,2%
Ataque
2001/2
73,9%
57,9%
Ataque

Campeonato Italiano
Temporada
Ataque
Defesa
Mais Importante
2010/1
86,0%
55,1%
Ataque
2009/10
66,4%
49,3%
Ataque
2008/9
85,8%
59,0%
Ataque
2007/8
88,3%
49,3%
Ataque
2006/7
77,9%
39,1%
Ataque
2005/6
61,3%
39,5%
Ataque
2004/5
55,4%
23,5%
Ataque
2003/4
76,7%
64,3%
Ataque
2002/3
73,1%
88,0%
Defesa
2001/2
66,6%
80,4%
Defesa

Campeonato Espanhol
Temporada
Ataque
Defesa
Mais Importante
2010/1
70,6%
36,3%
Ataque
2009/10
60,4%
56,5%
Ataque
2008/9
65,7%
27,8%
Ataque
2007/8
61,6%
54,0%
Ataque
2006/7
71,4%
64,2%
Ataque
2005/6
76,0%
76,0%
Igual
2004/5
70,6%
68,4%
Ataque
2003/4
60,4%
51,4%
Ataque
2002/3
65,2%
49,1%
Ataque
2001/2
65,7%
48,4%
Ataque
*Foram destacados em negrito os resultados em que a diferença entre ataque e defesa foi maior que 20 pontos percentuais

Nota-se que, dependendo do campeonato, a relação entre ataque e defesa varia radicalmente: no Brasil, a qualidade defensiva tem influência muito maior no campeonato; na Itália e Espanha, vale muito mais atacar. Na Inglaterra, a alternância de resultados não permite conclusões.

E como se explica tamanha diferença entre os campeonatos? Seria tentador afirmar que, em torneios com maior média de gols, a defesa é o diferencial e, em campeonatos retrancados, é o ataque que decide. No entanto, a comparação dos números ano a ano mostra que a relação entre essas variáveis é fraquíssima.

Mesmo sem entender os motivos, o fato é que as grandes diferenças de resultados (8x1, 2x8 e 0x9, para Brasil, Itália e Espanha) permitem afirmar com alto grau de certeza (da ordem de 95%, ou mais) que os resultados não são fruto de mera coincidência estatística. Ou seja: no Brasil, técnicos inteligentes têm que se preocupar primeiro com a defesa; na Itália e Espanha, montar um bom ataque traz resultados melhores.

3 comentários:

  1. Ou também pode-se dar outra interpretação na conclusão: no Brasil, os técnicos perceberam que os últimos vencedores priorizaram a defesa e mantiveram a fórmula "vencedora". Ninguém ousou mudar esse paradigma. É o velho enigma das bolachas Tostines adaptado...

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  2. Tomaz você chegou a fazer essa analise separado por posição no campeonato. Tipo influencia do ataque x defesa para er campeão, classificar para libertadores ou ser rebaixado?
    Acho que por exemplo defesas muito vazadas de times que ficam na parte inferior da tabela, ou ataques muito bons na parte superior podem afetar a analise.
    Outra idéia seja comparar a classificação dos times x saldo de gols

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    1. Oi, Guilherme,
      Não, não fiz a análise separadamente por posição - até porque, nesse caso, a metodologia teria que ser bem diferente.
      Mas os números nos extremos da tabela não deturpam a análise, porque eu só tomei como base a posição no ranking dos melhores ataques ou defesas, e não a quantidade de gols marcados ou sofridos. Assim, se o 2º pior ataque tiver marcado, por exemplo, 20 gols, dá na mesma o time de pior ataque ter feito 1 ou 19 - na lista, ele constará apenas como pior ataque.
      Sobre a classificação time x saldo, acho que aí nem precisa fazer a conta: com certeza a correlação é altíssima, em qualquer campeonato, mais do que a relação só com ataque ou defesa.
      Um abraço!

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